Escrevo um pouco sobre a história desta mandala — hoje está no meu consultório — e o que ela despertou em mim. Ganhei de um amigo querido que a fez com suas próprias mãos. No começo, quando a recebi e vi o seu centro, achei estranho: estava em branco. Admito que ao bater o olho nela, aquela brancura no centro instantaneamente me gerou um incômodo. E, foi olhando pra ela, contemplando, tentando me sintonizar com a imagem total que, de repente, algo mudou.
De um estranhamento, de um incômodo, passei a uma leveza de espírito, a uma sensação de “liberdade”. Explico o porquê disso através dos passarinhos que me visitaram naquele instante. Logo peguei uma caneta e papel para capturá-los antes que iniciassem o voo e eu os esquecesse (escrever é fotografar a alma): o vazio pode ser ambivalente: maldição e benção.
Maldição no sentido de que nos deparamos com o nada, com a falta de significado, com a eterna ausência, com o abismo sem fim. Fatalismo. Porém, se conseguirmos lidar criativa e corajosamente com essa falta, com essa ausência (necessária para a criação) preencheremos esse vazio de VIDA. Aí está o lugar que reside a benção: o espaço vazio/disponível para criarmos, ao nosso sabor e dentro do que nos for capaz, o nosso caminho.
Se um copo está cheio ou transbordando, não há espaço para mais nada.
Encerro essas breves anotações com um exemplo literário ao qual acabei de bater os olhos, citando o diálogo entre uma mulher chamada Noci e o narrador adolescente Mwanito (em um dialeto africano significa menino):
(...) Noci perguntou:
Mia Couto, Antes de nascer o mundo, p. 261, grifo meu
— Quem te ensinou a amar as mulheres?
Devia ter respondido: foi a falta de amor.
Espero que essas notas contribuam de alguma forma para sua vida,
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