Popularmente, conhecemos a palavra Eros como amor. Por outro lado, percebemos que as palavras erótico, erotização e erotizar tem Eros em sua raiz, porém, são empregadas no nosso vocabulário redutivamente quando relacionadas somente ao desejo sexual, à sexualidade concreta e carnal. Jung (1927/1970) amplifica o tema nos alertando que não se pode reduzir Eros somente aos atos físicos ou mesmo confundi-lo com sexo.
Para iniciarmos uma tentativa de compreensão mais plena de Eros, do seu relacionamento conosco e, por conseguinte, da pergunta que se faz título deste texto, é importante que nos voltemos à Mitologia Grega.
Eros na Mitologia Grega
Segundo Brandão (1997, p.186), Eros do grego Ἒρως (Éros), “significa desejo incoercível dos sentidos”. Eros, embora seja multifacetado, é a força fundamental do mundo e “garante não apenas a continuidade das espécies, mas a coesão interna do cosmo” (Brandão, 1997, p.187). Ou seja, Eros transita pela dimensão concreto — abstrato.
“Eros é uma força, uma ἐνέργεια (enérgueia), uma “energia”, perpetuamente insatisfeito e inquieto: uma carência sempre em busca de uma plenitude”. (Brandão, 1997, p.187).
Se assim o considerarmos como uma força/energia inerente ao ser humano que o impulsiona à sua plenitude, voltemos à pergunta: Onde está o seu Eros?
Caso a resposta não venha de imediato, não é preciso se desesperar! Talvez o seguinte parágrafo nos acalente diante de um estado de confusão a esta pergunta vital.
Do ponto de vista clássico da Teogonia (a origem dos deuses), Eros surgiu diretamente do Caos, o vazio primordial. Isto me lembra a seguinte passagem do Zaratustra de Nietzsche:
“Eu vos digo: é preciso ter ainda o caos dentro de si, para poder dar à luz uma estrela dançante. Eu vos digo, tendes ainda o caos dentro de vós.”
Percebemos então que às vezes é comum e necessário que fiquemos nos sentindo caóticos, pois é do caos que a força fundamental da vida pode brotar.
Um pouco do meu relacionamento com Eros
Eu diria que o meu Eros tem um forte e gostoso relacionamento com a Psicologia; ele está em estudar e explorar este terreno obscuro e cheio de mistérios que é a psique; em poder contribuir na qualidade de vida das pessoas; está em ouvir e criar música, a arte sonora do indizível; transita na oportunidade de reunir a minha família; em poder ver a minha companheira todos os dias e trocar, nem que seja, um simples abraço com ela; está em viajar num livro no sofá num dia chuvoso; está na possibilidade de criar profundidade em cada elemento que se apresenta em minha vida: desde a observação de uma trilha de formigas trabalhando conjuntamente, até a contemplação do noturno do céu. O meu Eros está em ter a vontade de escrever um texto como este. Enfim, está em tantas coisas e atividades — presente e latentes.
Grandes pensadores como Freud e Jung utilizaram Eros para se referir a uma energia que visava mais do que o simples prazer, mas acima de tudo, o amor pela vida. Podemos então compreender o quão doloroso é não saber onde ele está, pois perder a conexão com o Eros é como perder a conexão com a Vida.
Após uma breve caminhada com o deus do amor, retorno ao título que iniciou este texto: Onde está o seu Eros? Onde está a sua vida? O que Erotiza a sua vida?
Quando Eros se ausenta de todo, o vácuo é preenchido com atividade sem significação ou destrutiva.
Guggenbühl-Craig, 1998, p. 81
Espero que esse texto contribua de alguma forma para a sua vida. Um abraço e até a próxima,
Julio Ito
Psicólogo Clínico (CRP 06/130191)
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Você já se (re)visitou hoje?
(Foto por Julio Ito)
Referências
Brandão, J. (1997). Mitologia grega. Vol I. RJ, Petrópolis: Vozes.
Guggenbuhl-Craig, A. (1998). Eros de muletas: reflexões sobre amoralidade e psicopatia. Curitiba: Editora Corsária.
Jung, C. G. (1970). Women in Europe. Collected works, Vol. 10: Civilization in transition (2nd ed., R. F. C. Hull, Trans.). New York, NY: Bollingen. (Original work published 1927).
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