Você vive para quê? A serviço do que?
Essas são perguntas de cunho existencial que muitos já fizeram a si mesmos e muitos também não souberam responder.
Perguntas junguianas eu diria, pois além da visão causalista, Jung também adotou como complemento à visão causalista uma visão construtiva-sintética na sua Psicologia Complexa (Junguiana). Esta é uma visão direcionada para a finalidade (para que?), ao contrário de Freud que empregava uma visão causalista (por que?).
"Devemos considerar a psique do mesmo modo: a psique humana é somente em parte algo passado e como tal sujeito ao ponto de vista causal. Por outro lado, porém, a psique é um devir, que apenas pode ser entendido de modo sintético ou construtivo. O princípio de causalidade investiga apenas de que maneira essa psique se tornou o que é agora , tal como ela hoje se apresenta. A perspectiva construtiva, ao contrário, pergunta como se pode construir uma ponte entre esta psique e o seu futuro." C. G. Jung, Psicogênese das doenças mentais, vol. 3, §399
Ou seja, na Psicologia Complexa, o nosso psiquismo não é somente o resultado de experiências passadas, traumas e desejos, mas ele também contém as sementes de possibilidades futuras.
A partir deste conceito finalístico, pode-se dizer que não estamos aqui “por acaso”, mas que existe uma semente de um arranjo único pulsando em cada um de nós lá nas profundezas de nossa existência. Isso não quer dizer que se pode ser o que quiser (isso é para outros tipos de abordagem), pois é como se você dissesse que uma macieira - caso ela tenha o desejo - pode se tornar uma laranjeira.
Inseri abaixo uma transcrição de uma parte de um video que deixa bem clara essa questão da finalidade:
"[…]vUm dia desses aprendi algo sobre aviões. Algo que me deixou muito surpreso. Estava conversando com um piloto. Ele me disse que muita gente acha perigoso voar de avião, mas ele disse que, na verdade, é muito mais perigoso se o avião ficar no chão. Eu disse: “O que? Como assim?” Ele disse que quando o avião está no chão, ele começa a enferrujar, falhar e se desgastar muito mais rápido do que se estivesse no ar[…]"
Assim como os aviões enferrujam, falham e se deterioram aos poucos quando não estão no seu habitat natural e não estão fazendo aquilo que eles fazem de melhor (voar) – nós, seres humanos, do mesmo modo, enferrujamos, começamos a falhar e nos desgastamos se nos afastamos de nossa natureza. Podemos também imaginar que um barco não foi criado para ficar atracado no porto: ele foi feito para navegar.
Nessa questão, Jung (1991) é bem enfático quando explica que nos casos em que o indivíduo se desvia do seu fluxo natural, o seu bem-estar fisiológico pode ficar comprometido, pois esse processo provoca forte esgotamento.
A nossa alma, quando não ouvida, poderá manifestar essa incongruência/insatisfação através do nosso corpo, oferecendo dicas e sinais de todos os tipos e, por vezes, gerando os sintomas e o adoecimento. Cabe a nós e somente a nós, prestar cuidado e atenção a essas mensagens tão importantes para a realização de uma vida que tenha sentido e significado.
As perguntas então estão lançadas:
Para que você vive?
O que você faz de melhor?
O que você faz com prazer? O que gosta de fazer?
Qual é o seu propósito de vida?
Para que você acorda todo dia?
O que faz os seus olhos brilharem?
O que dá significado à sua vida?
Essas são apenas algumas perguntas que podem nos ajudar ou causar o efeito contrário: nos assustar. De fato, não é uma tarefa simples, pois exige uma série de atributos como paciência, coragem, reflexão e autoconhecimento. Estes podem ser favorecidos com a ajuda de um Psicólogo num processo de psicoterapia. O consultório, numa visão junguiana, não tem a intenção apenas para tratar "doenças", mas também para impulsionar o desenvolvimento da personalidade.
Já vi muitas dicas, gráficos, modelos de roteiros, “como fazer”, “como conseguir” etc. como se fossem uma receita para “encontrar seu propósito”. Acredito que toda forma de reflexão seja válida, porém, acredito mais ainda que essa grande questão existencial que permeia as nossas vidas não deva ser reduzida a meras perguntas ou sistematizações lógico-racionais, mas principalmente precisa ser ampliada através de um diálogo sincero e espontâneo consigo mesmo. Como afirmou Jung (1985, p.39):
“[…] não existe uma receita de vida válida para todo mundo. Cada qual tem a sua forma de vida dentro de si, sua forma irracional que não pode ser suplantada por outra qualquer.”
Espero que esse texto contribua de alguma forma para a sua vida. Um abraço e até a próxima,
Julio C. N. Ito Psicólogo Clínico (CRP 06/130191) — Você já se (re)visitou hoje?(Fotos por João Pedro Chain)
Referências Jung, C. G. A prática da psicoterapia: contribuições ao problema da psicoterapia e à psicologia da transferência. OC XVI/1. Petrópolis: Vozes, 1985.
________. Psicogênese das doenças mentais. OC III. Petrópolis: Vozes, 2013.________. Tipos Psicológicos. OC VI. Petrópolis: Vozes, 1991.
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Fera!! Gostei muito do texto!
Muito bom o texto! Vou mostrar para os meus amigos que vivem fazendo perguntas desse gênero…
abraço ✌
Obrigado, Wagner 🙂
Ótimo, João. Estou à disposição, abraço