Composição musical x psicoterapia/análise
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por Julio Ito
Psicólogo (CRP 06/130191)

O início

Estava refletindo esses dias sobre o processo de psicoterapia/análise e como alguns pontos compartilham semelhanças com um processo de composição musical. Ambos fazem parte da minha rotina, isso explica essa conexão. Mas vamos lá: como é que ocorre então um processo de composição musical? Bom, cada pessoa vai ter seu próprio estilo pra compor. No meu caso, já aconteceu de diversas formas: primeiro a letra, depois o instrumental. Primeiro a melodia, depois a letra. Primeiro os instrumentos e depois a letra e depois a melodia. Não existe uma regra. A única expectativa é que no final, de sabe-se lá quanto tempo vai durar, o fruto desse trabalho traga como resultado uma música. E como assim sabe-se lá quanto tempo vai durar?

Composição musical: uma breve descrição

Vou te explicar: no meu processo de composição eu não pré-determino um tempo. Quando eu percebo algum impulso pedindo por expressão, musicalmente, eu pego meu violão ou meu caderno de composição. E aí nesse processo, pode ser que eu venha a começar a caçar algumas notas, se eu estiver no violão, ou que eu venha a começar a caçar algumas palavras, se eu estiver com o caderno na mão. E pode ser que algumas palavras também sejam encontradas enquanto eu estou no violão e vice-versa, por que não?

Em 99,9% dos casos, eu nunca termino uma composição no mesmo dia porque sei que tanto eu como a própria música precisamos digerir o que foi feito no dia e que essa será apenas a primeira versão, provavelmente a primeira de muitas! Preciso ficar com a música, com a letra, com os sons circulando dentro da minha alma. Aí no dia seguinte, pode ser que eu fique “estancado” na composição e não me venha nenhuma ideia nova para poder aprimorar ou concluir a música e enquanto isso vou vivendo minha vida fazendo outras coisas. Pode ser que enquanto eu estiver lavando louça, me ocorra aquela nota ou palavra ou frase que faltava pra música. Uma espécie de “eurekka!”.

Pode ser que...

Pode ser que dias se passem e que talvez eu desencane por um tempo e continue fazendo outras coisas. Pode ser que anos se passem e, de repente, por conta da minha vida que continuou rolando, venha até mim o material musical que eu precisava pra concluir aquela música de anos atrás. É como encontrar aquela peça de um quebra-cabeças aparentemente insolúvel. Como um grande de um insight!

Você deve estar se perguntando. Tá bom Julio, que legal que você compõe suas musiquinhas assim. Mas o que isso tem a ver com o processo de psicoterapia / análise? Oras... tem TUDO A VER.

A conexão entre composição musical e psicoterapia/análise

Esse processo de composição que eu apresentei é como um processo psicoterapêutico. Algumas impressões que temos no início, só poderão ganhar forma, só poderão ganhar corpo, só poderão se tornar mais claras com uma constante digestão dos conteúdos que são apresentados em cada sessão na própria psicoterapia. A alma também precisa digerir as coisas. O nosso psiquismo não consegue integrar os conteúdos imediatamente. Não basta só “reconhecer” determinado conteúdo; esses conteúdos precisarão passar por um processo de digestão. E essa digestão, frequentemente demora! Isso vale para os insights de qualquer natureza: de um apontamento, de uma autoconsciência, de um trabalho com os sonhos... Como o Jung diz, a relação terapêutica é uma constante troca e combinação de elementos químicos que vão se transformando com o decorrer do tempo.

Conclusão

Enquanto algumas composições estão fazendo sua digestão para serem finalizadas, pode ser que outras novas composições surjam nesse meio tempo e se completem antes que as antigas. Isto pode acontecer porque os temas que são trabalhados em cada composição são diferentes. E devido a uma maior facilidade com as temáticas de uma música, ela acaba sendo digerida mais facilmente; já outras, são mais difíceis pra nós, portanto, mais pesadas e precisam de maior tempo.

Gravei um vídeo sobre este texto aqui: COMPOSIÇÃO MUSICAL X PSICOTERAPIA/ANÁLISE: O QUE ELES TÊM EM COMUM? - YouTube

E aí, fez sentido pra você? Se você gostou, compartilha e comenta aqui. Um abraço e até a próxima!

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JULIO ITO
Psicólogo (CRP 06/130191), psicoterapeuta junguiano, músico, facilitador de workshops, pesquisador e professor convidado do curso de Pós-graduação em Teoria e Prática Junguiana do Instituto Solaris (RJ).

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